Lá na Instituição, aos sábados, é uma correria e tem mais barulho do que nos outros dias. Aos sábados recebemos as crianças. É o dia delas. Com aquele burburinho típico, com a rotina completamente mudada por conta de suas risadas deliciosas, de suas múltiplas perguntas que exigem respostas imediatas, por sua curiosidade mais do que normal, chegando a ser atrevida, às vezes.
Que delícia isto tudo.
Naquele sábado, quando as expositoras se preparavam para mais uma aula e se dividiam para os afazeres da festa do dia das crianças, Adelaide ralhava com as crianças, descendo as escadas freneticamente, a procura de seus óculos. Chamava, pelos nomes, os alunos e os advertia que, se não encontrasse os seus óculos, suspenderia as atividades de preparação para a festa do dia das crianças.
Mas, com aqueles sorrisos lindos e desinteressados, com aquele jeitinho traquina, as crianças se atropelavam, subindo e descendo as escadas, na maior correria, deixando nossa pobre Adelaide completamente sem rumo.
Voltem aqui já! Não corram! Ai meu Deus, esta escada! Cuidado meninos e meninas! Andem mais devagar! Onde estão meus óculos? Vocês têm de me dar conta disto, ou, nada de festa, heim!
Tia Adelaide, preste atenção. Diziam eles sorrindo, sem parar de correr. E caiam na risada.
Cantavam as canções, já tantas vezes ensaiadas em sala de aula e revezavam nas explicações sobre a coitada da Adelaide que não conseguia alcançá-los.
Lá vem tia Beth e tio Tadeu em seu auxílio, tentando controlar as crianças com sua energia sem fim. E, num instante, as crianças são direcionadas para suas salas de aula e a ordem volta a reinar. Cada turma é orientada para seu dever do dia. Cada sala tinha a incumbência de confeccionar as lembrancinhas e montar os kits de guloseimas para a festa. Outras se empenhavam nos ensaios das músicas e de outras apresentações para a festa. E lá ia Adelaide, resmungando aflita, procurando por seus óculos. Sem eles, ela não poderia fazer nada. Precisava ler e escrever e ainda muita coisa tinha de ser feita. Tinha de repassar tudo e organizar de forma simples para distribuir o roteiro da festa a todos, crianças e adultos.
Onde estão meus óculos? Não estou gostando nada desta brincadeira. Estas crianças são terríveis. Falava alto para todas ouvirem, mas, em seu rosto havia aquela expressão bonachona que as crianças conheciam tão bem. As crianças amavam muito a querida tia Adelaide.
A tarde era curta para tantas atividades. Fizeram todos os cartazes, embalaram os doces e chocolates, acondicionaram nas sacolinhas, fizeram todos os desenhos, ensaiaram as falas para a apresentação teatral, decoraram o jogral, enfeitaram as salas e o salão principal, cantara, riram, escreveram, brincaram... Sempre alegres e dispostos, supervisionados pelos tios Tadeu, Beth e Adelaide...
Quase no fim do período, quando as atividades já estavam por se encerrar, Adelaide, já meio descabelada e super atrapalhada por não enxergar direito, senta-se e tenta enxugar o suor que já lhe escorria pela face. Ao passar seu lenço pela testa, sente algo estranho e é surpreendida por um objeto, preso ali.
Entre risadas estrondosas e muitas piadinhas das crianças e dos outros expositores, Adealide também gargalha de seu constrangimento. Olha aí onde estavam os seus óculos, o tempo todo. Em sua testa, bem firme e imponente, como um verdadeiro troféu.
Logo deduziu que todos estavam vendo, menos ela e que as crianças haviam, realmente, lhe pregado uma peça, não contando onde estavam os óculos, a vista de todos, menos dela mesma.
Aos gritinhos, as crianças lhe diziam: viu só, tia Adelaide, quem tem de prestar mais atenção?
E todos riram em conjunto, muito felizes, por mais uma tarde na Instituição, ao lado de tão queridos companheiros.